Fotógrafo brasileiro expõe dia a dia de favela carioca nos corredores da Sorbonne
Baterista, DJ, professor de História e fotógrafo, Yan Carpenter, de 31 anos, saiu do Brasil pela primeira vez para expor suas imagens na Sorbonne ArtGallery, o espaço dedicado à arte na icônica universidade parisiense. Ele venceu um projeto que oferece uma residência em Paris para artistas de outros países e expõe sua mostra Giro nos Acessos no festival Photo Days, que acontece em diversos locais da capital francesa até o dia 30 de novembro. Tatiana Ávila, da RFI em Paris Com sorriso aberto e orgulhoso dessa primeira mostra internacional, Yan Carpenter recebeu a reportagem da RFI nos corredores da galeria Soufflot, no campus Panthéon Sorbonne, no 5º distrito de Paris. Natural do Rio de Janeiro e tendo nascido e crescido em bairros pobres da cidade, ele falou sobre autoestima, visibilidade de pessoas negras e contou um pouco da sua trajetória até a exposição na França, que marca também sua primeira viagem para fora do Brasil. “No colégio juntei com meus melhores amigos e fizemos uma bandinha. Eu comecei dentro da música porque eu achei nos shows, nos ensaios e nas apresentações, uma forma de me sentir visível. Essa banda me deu muito conhecimento sobre a rua, e nos intervalos dos shows eu pegava a câmera do fotógrafo para mexer, o que foi despertando o meu interesse”, disse ele, que, com o fim da banda, vendeu a bateria e comprou uma câmera fotográfica. A partir daí, ele conta que aprendeu sozinho e que acabou ganhando uma nova profissão. Segundo Yan, há alguns anos, a falta de referências fez com que ele se lançasse numa busca individual. “Eu sempre falo de autoestima porque hoje eu me acho um cara bonito, inteligente, mas 15, 20 anos atrás, isso era muito difícil, porque a autoestima do preto não estava em voga. A gente não via semelhantes nas ruas, e eu descobri que aprender por mim mesmo era uma forma de me tornar mais valioso e de desmistificar um pouco as pessoas. Porque eu me enxergava sempre muito pequeno perante os outros justamente por não me sentir dentro dos conceitos”, contou. De Guadalupe para Paris O fotógrafo falou ainda como conquistou a residência no projeto que o trouxe para Paris. “Foi uma sucessão de acontecimentos desde 2020. Eu comecei a minha carreira dentro da moda, eu cobrava R$ 50 por ensaio, mas eu não era um profissional que chamava a atenção para as pessoas me pagarem. E quando eu fiz 25 anos, eu saí de casa e fui trabalhar numa hamburgueria (fazendo as fotos como trabalho extra), mas quando veio a pandemia eu não podia mais encontrar as pessoas e fazer minhas fotos. Isso me quebrou muito. Como eu morava na favela do Rio das Pedras e trabalhava na Barra da Tijuca, eu ia andando fazendo fotos. Nisso, eu me descobri fazendo foto da rua, de 2019 para 2020, porque eu vi que eu conseguia dar o peso que eu não conseguir dar para o rosto das pessoas. Porque o meu problema com a moda era que eu via sinais nos rostos das pessoas e eu queria muito ressaltar isso, porque isso conta histórias sobre elas. E eu via que na rua eu podia fazer isso sem as pessoas reclamarem”, lembrou. “Um dia eu fiz uma foto em um ônibus, que se chama ‘O avião do trabalhador’, e a ela se tornou viral. Teve 15 mil curtidas, a Folha de S.Paulo me ligou, eu fui parar na capa do UOL, da Galileu e tudo começou a acontecer. Nessa semana eu conheci a Carol Maluf, que se tornou a minha agente em São Paulo. Ela é mecenas, foi vice-diretora da MTV e me patrocinou”, contou ele, dizendo que a partir do patrocínio, fez sua primeira exposição em São Paulo, quando vendeu todas as 28 obras, o que marcou definitivamente sua vida. “Eu passei a viver das minhas fotos, não confortavelmente, mas nunca mais precisei trabalhar em empregos secundários ou terciários”, conta. Depois veio o contato com Sandra Hegedüs, fundadora do Sam Art Project, que esteve no Brasil e que o escolheu como seu candidato para vir a Paris. Após vencer outros artistas, Yan foi o escolhido para passar um mês na Cidade Luz, com suas fotos expostas na Sorbonne. Sorbonne Art Gallery e Photo Days A mostra de Yan Carpenter acontece graças a uma parceria da Sorbonne ArtGallery com o Photo Days, um festival que promove exposições de fotos em lugares clássicos, mas também em locais insólitos de Paris. Em sua sexta edição e realizado uma vez por ano, o evento tem como foco a cena emergente internacional, oferecendo a jovens artistas um espaço de visibilidade e diálogo. Yann Toma, diretor artístico e curador da Sorbonne ArtGallery, explica que o espaço, situado dentro da universidade, “é um lugar comandado e administrado por artistas e para os artistas”. Ele falou sobre a oportunidade de abrigar a mostra Giro nos Acessos. “Aqui, com Yan Carpenter, estamos nessa inter-relação com a sua geração, já que ele é muito próximo dos artistas de rua, com sua energia, com o fato de nunca ter saído da favela antes. Ele chega a Paris com essa energia de autenticidade incrível e, evidentemente, com seus registros fotográficos diretos, que para nós são muito significativos, sobretudo em relação à nossa parceria com o Photo Days”, destacou Toma. Parceria com o Brasil Yann Toma destacou ainda mais uma parceria com o Brasil, que acabou rendendo muitos frutos, especialmente no âmbito da sessão cruzada do Brasil na França. “Temos uma parceria a qual prezamos muito, que surgiu por meio do Photo Days, com o Initial Labo, um laboratório fotográfico que trabalha diretamente com os artistas, como se fazia antigamente em um laboratório de fotografia analógica. Há esse espírito da fotografia analógica, mas evidentemente com uma dimensão digital. Esse laboratório é dirigido por Denise Zanet, uma especialista em fotografia, além de colecionadora de obras fotográficas. Ela promove trabalhos muito singulares que unem fotografia plástica, fotografia de reportagem e, de forma mais ampla, fotografia artística. Ela acompanha tudo isso no contexto do Ano França-Brasil, em relação com a Embaixada do Brasil na França e também diretamente no Brasil". Explicou Toma, ressaltando ainda a possibilidade de trabalhar, junto ao laboratório, em formatos que vão muito além dos moldes tradicionais, respondendo às aspirações dos artistas. No site do Photo Days é possível encontrar um mapa de Paris onde estão indicados todos os locais de exposições, disponíveis até 30 de novembro. A exposição de Yan Carpenter na Sorbonne ArtGallery é gratuita com ingressos disponíveis para serem baixados também direto na página oficial do evento.