Como El Salvador passou, aos olhos de Trump, de país perigoso a ‘Suíça da América Central’
Desde que Donald Trump retornou à Casa Branca, as relações dos Estados Unidos com El Salvador se intensificaram. O pequeno país da América Central, conhecido no passado por seus altos índices de violência e pelo regime repressivo imposto pelo presidente Nayib Bukele, caiu nas graças do republicano. O novo protagonismo salvadorenho despertou interesse na imprensa francesa, depois da França ter sido rebaixada na lista de países considerados seguros pelos EUA, ficando atrás de El Salvador. A revista Le Point explica que o país da América Central passou para o “nível 1” de segurança na lista de recomendações de viagem do governo Trump, enquanto a França recuou para o “nível 2”, o que significa que os turistas devem ter mais cautela ao visitar as cidades francesas. “Desde o início de abril [de 2025], o Departamento de Estado norte-americano considera que os viajantes estão mais seguros andando pelas favelas de San Salvador do que visitando os castelos do Vale do Loire”, compara a revista. No entanto, há menos de dez anos, lembra a Le Point, a capital salvadorenha era considerada a cidade mais perigosa do mundo.A revista francesa aponta que a queda dos homicídios registrada em El Salvador desde a implentação da política de linha-dura do presidente Nayib Bukele, eleito em 2019, contribui para essa mudança de patamar em termos de segurança. Porém, a postura repressiva do chefe de Estado salvadorenho, autoproclamado “o ditador mais cool do planeta”, é marcada por vários excessos, como mostram as imagens das condições de detenção nas prisões do país, que especialistas ouvidos pela imprensa francesa não hesitem em qualificar de “campos de concentração”.A reportagem da Le Point visitou o Cecot, o centro de confinamento para terroristas, para onde são enviados muitos imigrantes deportados dos Estados Unidos, como parte da política de expulsões em massa do governo Trump. O texto relata as condições extremas do regime de detenção. “Os presos ficam trancados durante 23h30 diárias, têm apenas 15 minutos para fazer exercícios e 15 minutos para ouvir a Bíblia, sentados em fila diante de suas celas”, detalha a reportagem.O Cecot e a queda da criminalidade servem de vitrine para El Salvador. “O sonho de Bukele é transformar seu pequeno país, antes violento, em um paraíso turístico”, resume a Le Point. "As praias na costa do Pacífico são excelentes e estão começando a atrair alguns surfistas americanos, enquanto publicidades já anunciam a construção de hotéis de luxo", detalha o texto. Mas especialistas ouvidos pela revista explicam que promover El Salvador como um novo porto seguro também é do interesse dos Estados Unidos. Se Bukele tenta atrair turistas e investidores para seu país, Trump não apenas terceiriza o sistema carcerário, como terá uma boa justificativa para recusar a entrada de salvadorenhos nos Estados Unidos, principalmente quando eles alegarem estar fugindo de um país perigoso, resume a publicação francesa.140 decretos em 100 diasSe apoiar no sistema penitenciário repressivo de El Salvador para expulsar imigrantes ilegais é apenas um dos pilares da política de Trump, que assinou 140 decretos em apenas 100 dias de mandato, como lembra a revista Nouvel Obs. A publicação ressalta que a imigração está entre os dez assuntos abordados por decretos da Casa Branca, embora outros temas tenham sido alvo de medidas bem mais numerosas. No balanço apresentado pela Nouvel Obs, dos 140 decretos assinados por Trump, 13 são relacionados com imigração, enquanto 24 dizem respeito a questões de segurança nacional e 29 atingem a economia e o comércio norte-americano.Aliás, como aponta a revista L’Express, essa metralhadora de decretos de Trump começa a preocupar até parte de seus apoiadores. “Muitos americanos parecem perplexos com a escala das mudanças em andamento”, resume a publicação. “A batalha legal nos tribunais sobre questões de imigração e a pressão exercida sobre as universidades do país estão causando polêmica”, ressalta a reportagem. “As tarifas impostas pelo presidente e a guerra comercial que ele desencadeou com a China também cristalizam dúvidas e aumentam o temor de alta da inflação, que muitos eleitores esperavam que diminuísse com seu retorno ao poder”, explica a revista L'Express.